Tuesday 1 October 2013

Diz-se que a melhor bifana da capital é no Trevo, o café de todos os bons vagabundos. Não sei se é verdade - mas eu ainda não comi melhor.  Ontem estava ao balcão uma miúda alta, magra, de botas e blusão paramilitar, cabelo da cor do cobre quando chove. Perguntou quanto era a coxa e pediu um Donut.

O homem das carnes, baixinho, quadrado e peludo, com um valente bigode, desdobrava-se todo para falar com ela. Dizia-lhe que se fosse preciso ela ficava a dever à casa, não havia problema nenhum.  Para lhe indicar o supermercado mais próximo esteve a recitar as moradas dos mercados todos de Alcântara a Alfama. O homem nem conseguia falar, mas não queria deixar a conversa acabar. Ela agradecia e ele apontava numa direção qualquer e balbuciava Pingo Doce ou Minipreço.

- Posso ir para qualquer lado, por tanto, - disse-lhe, meia a rir-se, meia com ar de quem já sabia que se ia perder. Eu ainda tentei ajudar e indiquei que o mais próximo era mesmo ali, mas não havia grande lugar para mim naquele diálogo.

O homem apontou um polegar gordo para trás e disse: -A descer e depois ...Continente. -

Ela agradeceu, riu-se, limpou os dedos com o guardanapo, amarrotou-o, empurrou o prato para o balcão e saíu. Ele foi encostar-se à montra a abanar a cabeça. Soltou tal suspiro que perdeu de ombros quase quatro centímetros. Ficámos todos a olhar pelo vidro e durante o mais curto dos segundos ainda apareceu a miúda de cabelo celta debaixo dum tecto de guardachuvas, por trás duma cortina de chuva, no meio das multidões do Chiado. Ela já tinha desaparecido há muito quando ele se descolou. Lamuriou-se baixinho:

-Há gente tão bonita, e eu sou tão feio.

-o Bigodes do Trevo

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